A ELISÃO TRABALHISTA
José Eduardo de Resende Chaves Júnior[1]
Elisão fiscal é um conceito
tributário, no qual se oferece um regime de pagamento de impostos mais
vantajoso para a empresa, sem que com isso ela incida em sonegação fiscal. A
carteira de trabalho verde-e-amarela pretende instituir a novidade da elisão
trabalhista.
Segundo o virtual Ministro
Paulo Guedes, o trabalhador 'opta' se quer a porta da esquerda, com a carteira
azul, ou a porta da direita, com a carteira verde-e-amarela, sem qualquer encargo
para empregador - e evidentemente com elisão de direitos trabalhistas do
trabalhador.
Elisão, tanto do ponto de
vista semântico, como do econômico, significa suprimir algo. Na esfera fiscal,
essa supressão significa, em termos concretos, algo similar à renúncia
tributária por parte do governo (ou por meio de interpretação); na esfera
trabalhista importa em sonegação bruta de prestação econômica ao empregado. Em
outras palavras, na elisão fiscal renuncia-se a receita própria, na elisão
trabalhista, a 'renúncia' é de direito alheio, do empregado.
Não bastasse isso, é
importante assinalar que não existe opção numa relação de assimetria econômica
como a trabalhista. Quem vai optar, é claro, será o patrão. O empregado será
'optado'.
Estratégia similar foi
utilizada pelo então ministro do planejamento do regime militar, Roberto Campos,
que acabou com estabilidade decenal em 1966, sem revogar a CLT. O art. 492 da CLT, que previa tal
estabilidade, nunca foi revogado expressamente, mas partir da Lei 5.010/1966
todos empregados 'optaram' pelo FGTS. Morreu o regime de estabilidade sem
revogação da CLT. Operou-se o que os juristas chamam de desuetudo.
Em 1988, como não havia
novos empregados com expectativa de adquirirem a estabilidade decenal, a
Constituição estendeu o FGTS a todos, acabou com a hipocrisia da falsa opção.
E sem estabilidade para os
trabalhadores da base, os sindicatos enfraqueceram-se, pois não há como
enfrentar o poder patronal sem a garantia do emprego.
A rotatividade de
trabalhadores hoje no Brasil é muito alta. A média de duração dos empregos é 5
anos e 8 meses. Em menos de 5 anos não haverá mais celetistas, só verde-e-amarelinhos
'optados', pois quem não optar certamente perderá o emprego.
A duplicidade de regime
subordinado, por escolha teórica do empregado, mas por opção prática do
empregador, não existe em nenhum lugar do mundo. A elisão trabalhista seria a
nossa maior jabuticaba, sem dúvida.
Um detalhe, a Constituição
opta claramente pelo regime único da relação de emprego protegida, no inciso I
do Artigo 7°. Além disso, tal garantia do trabalhador é cláusula pétrea e não
pode ser objeto de emenda constitucional supressiva, segundo o artigo 60, § 4º, IV da nossa Carta Magna.
Seria interessante que o
novo governo evitasse acirrar as relações entre patrões e empregados. Isso
desestabiliza a economia, aumenta o passivo trabalhista e potencializa a insegurança
jurídica, com reflexo direto no investimento interno e externo.
A CLT sofreu mais de mil
alterações desde a sua entrada em vigor, sofreu uma profunda reforma há um ano,
é muito diferente do seu modelo inicial. Com a CLT vivemos crises e retomadas
econômicas. Não precisamos de pirotecnias legais, mas de tranquilidade
jurídica, com respeito à Constituição e aos direitos conquistados pelos
trabalhadores, com muita luta e sangue. Precisamos de um Direito do Trabalho da
paz, não enviar o país para uma guerra trabalhista.
Publicado no Conjur https://www.conjur.com.br/2018-nov-16/jose-chaves-carteira-verde-amarela-instituir-elisao-trabalhista
[1] José Eduardo de Resende Chaves Júnior, é doutor em Direitos
Fundamentais, Professor Adjunto do IEC-PUMINAS, Desembargador do TRT-MG,
Presidente da União Ibero-americana de Juízes - UIJ.
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