José Eduardo de Resende Chaves Júnior[1]
A
reforma trabalhista vem de permitir a terceirização das atividades principais
da empresa. Independentemente
do debate sobre a constitucionalidade da terceirização da atividade-fim, parece
útil trazer para ordenamento trabalhista brasileiro o instituto do joint employment,
sacramentado na jurisprudência norte-americana deste a década de 40 do século
passado, como vem divulgando o Professor Cássio Casagrande. Como se sabe, a
integração analógica do sistema brasileiro de regulação do trabalho pelo
direito comparado está expressamente autorizada pelo artigo 8° da CLT.
Joint Employment é uma
doutrina construída pela jurisprudência trabalhista dos Estados Unidos, que
prevê a existência de um contrato de trabalho compartilhado, quando o
trabalhador desempenha uma função que, simultaneamente, beneficia duas ou mais
empresas.
Em geral, a teoria do joint
employment é concebida em três
situações:
(i) quando existe um
acordo entre empresas para compartilhar os serviços do empregado (Slover v. Wathen, 140 F. 2d 258 - C.A. 4;
Mitchell v. Bowman, 131 F.
Supp.);
(ii) quando uma
empresa atua direta ou indiretamente no interesse de outra ou outras empresas
em relação ao trabalhador (Greenberg versusArsenal
Building Corp., et al., 144 F. 2d 292 - C.A. 2).
(iii) quando as
empresas não estão completamente desassociadas em relação ao emprego de um
empregado em particular e podem ser consideradas como compartilhando o controle
do empregado, direta ou indiretamente (Dolan
v. Day & Zimmerman, Inc., et al.,65
F. Supp. 923 - D. Mass. 1946).
(Cfr. US Code
of Federal Regulation,
29 - Labor: §791.2 Disponível em https://www.law.cornell.edu/cfr/text/29/791.2
)
Essa teoria parece perfeitamente compatível com a dogmática
brasileira. O trabalhador que exerce habitualmente função inserida nas
atividades essenciais do tomador final de seus serviços e, nessa condição, sujeito
a supervisão, direção ou regramento operacionais estabelecidos pela res productiva, para além das ordens
executivas emanadas do empregador putativo, tem direito ao status jurídico do vínculo empregatício compartilhado entre
as empresas que se beneficiam conjuntamente de seu trabalho, independentemente
da ilicitude ou não da terceirização.
Por um lado, o princípio constitucional da isonomia impõe o
tratamento igualitário a todos aqueles que se encontrem numa mesma situação
fática de trabalho, o que nos conduz à extensão das condições jurídicas de
trabalho dos empregados da tomadora aos empregados da empresa prestadora de
serviços.
Por outro, o princípio da norma mais favorável ao empregado,
induz, da mesma forma, a extensão, por conglobamento, dos direitos trabalhistas
aos terceirizados.
Nesse sentido, o outsourcing
é concebido e observado juridicamente, como mera ferramenta de gestão. A nova organização produtiva irradia-se por
meio de um processo aparentemente paradoxal, de concomitante expansão e fragmentação, ou seja, com incorporação de campos econômicos
adjacentes, mas com incremento da especialização operativa.
Tal prática induz, na esfera do direito, uma forma especial
de contrato-realidade, de maneira a suscitar a
vinculação jurídica empregatícia compartilhada, que congloba o status jurídico mais benéfico ao
trabalhador.
Nesse novo ambiente de produção, mais estendido e
especializado, cabe ao trabalhador, ali inserido habitualmente, apenas colaborar para não embaraçar o fluxo
produtivo. Essa nova organização do trabalho imprime uma espécie de cooperação
competitiva entre os trabalhadores, que prescinde, em muitos casos, do sistema
clássico de disciplina
(FOUCAULT) individualizada, privilegiando o controle
(DELEUZE) coletivizado e estatístico dos trabalhadores. Perde espaço a
singularização hierárquica.
Em certa medida, desloca-se a concorrência da esfera do
capital para o ambiente de trabalho, porquanto a própria equipe se encarrega de
cobrar, uns dos outros, o aumento da produtividade do grupo. Processa-se uma
espécie de sub-rogação do comando empregatício, que passa a ter um viés muito
mais horizontal e reticular, constituindo uma forma latente de subordinação, que se projeta muito mais
como potência do que ato.
A ideia do vínculo de
emprego compartilhado aperfeiçoa-se independentemente da
declaração de desconstituição formal do contrato de trabalho e incide apenas no
campo trabalhista, sem afetação necessária nas esferas civil, empresarial,
administrativa ou mesmo previdenciária. Similar e correlato à figura do grupo
econômico trabalhista, o instituto do joint
employment tem inflexões
restritas e internas ao âmbito da autonomia científica e jurídica do Direito do
Trabalho.
A doutrina do joint
employment é um concerto
jurídico que, a par de garantir o (i)exercício da livre iniciativa, a
(ii)flexibilidade de gestão e o (iii)foco empresarial nas atividades mais
estratégicas, não se descura dos preceitos constitucionais de isonomia, de
proteção ao trabalho humano e de progressividade social.
Publicado originalmente no Valor Econômico: http://www.valor.com.br/legislacao/5243201/terceirizacao-e-o-
[1] José Eduardo de Resende Chaves Júnior, é Doutor em
Direitos Fundamentais, Professor Adjunto do IEC-PUCMINAS e Desembargador do
TRT-MG
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